STF veta que investigado seja levado à força para prestar depoimento

Foto:Antônio Cruz/Agência Brasil 

A condução coercitiva para interrogatório, que ficou famosa na Lava Jato, é inconstitucional e fere os direitos do investigado de ficar em silêncio, de não produzir provas contra si mesmo e de ir e vir, decidiu o Supremo Tribunal Federal nesta quinta-feira (14) por 6 votos a 5.

Seis ministros votaram por proibir esse instrumento: Gilmar Mendes (relator), Rosa Weber, Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski, Marco Aurélio e Celso de Mello. Cinco votaram por sua legitimidade, embora com algumas diferenças: Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Luiz Fux e Cármen Lúcia.

Investigadores da Lava Jato dizem acreditar que, com o veto ao instrumento, o número de prisões poderá aumentar. Vários alvos da operação já passaram por conduções do gênero, como o ex-presidente Lula, levado pela PF para depor em março de 2016.

No julgamento do STF, os magistrados julgaram duas ações que questionavam as conduções coercitivas para interrogatório. As ações foram ajuizadas pelo PT e pela OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), que sustentaram que a medida violava o direito dos suspeitos de permanecer em silêncio e de não se autoincriminar, entre outros.

Desde dezembro passado, as conduções coercitivas para esse fim estavam suspensas por uma liminar de Gilmar. Nesta quinta, a maioria manteve a liminar e decidiu o mérito da questão, proibindo em definitivo que a polícia leve coercitivamente pessoas investigadas para depor.

Conforme o voto do relator, os depoimentos já tomados por meio de condução coercitiva não serão anulados. A partir de agora, agentes públicos que descumprirem a decisão sofrerão sanção.

A decisão atendeu ao pleito dos advogados de investigados. "Representa uma grande vitória para os direitos fundamentais, em especial o direito de defesa, e uma mensagem clara de que os abusos não serão mais tolerados pelo STF", disse Juliano Breda, da OAB.

Gilmar, Toffoli, Lewandowski e Marco Aurélio enfatizaram em seus votos um ponto em comum: que um sistema penal punitivista afeta também pessoas pobres e não só políticos corruptos.

"A legislação não se aplica somente àqueles envolvidos em possível prática de corrupção, ao crime do colarinho branco. Não são apenas esses que são conduzidos [pela polícia]. São os envolvidos em geral em prática criminosa. Queremos no Brasil dias melhores? Queremos todos nós. Mas não podemos partir para o justiçamento, sob pena de não ter-se mais segurança jurídica, vivendo a sociedade a sobressaltos", disse Marco Aurélio.

Ao votar, Lewandowski louvou a "jurisprudência garantista" da corte e mencionou decisões recentes nesse sentido, como o habeas corpus que liberou da prisão mulheres grávidas que cometeram crimes de menor potencial ofensivo.

"É chegado o momento em que o Supremo, na tutela da liberdade de locomoção, impeça interpretações criativas que atentem contra o direito fundamental de ir e vir e contra a garantia do contraditório, da ampla defesa e da não autoincriminação", afirmou Toffoli.

Na semana passada, quando o julgamento começou, Gilmar classificou as conduções de "novo capítulo da espetacularização da investigação que ganhou força no país".

Moraes, Fachin, Barroso, Fux e Cármen Lúcia votaram pela legalidade do instrumento, ressaltando que sempre deve ser garantido ao investigado o direito de ficar em silêncio e de ser assistido por seu advogado. O voto de Moraes foi mais restritivo. Para ele, a condução coercitiva para interrogatório só é permitida quando o investigado tiver sido intimado previamente e não tiver comparecido.

Já Fachin, Barroso, Fux e Cármen Lúcia admitiram essa hipótese e, além dela, que a condução possa ser empregada em substituição às prisões cautelares (temporária ou preventiva) -tipo de uso que foi comum nas operações da Lava Jato sob responsabilidade do juiz Sergio Moro.

O argumento dos ministros era que, em benefício do suspeito, o juiz poderia trocar uma medida mais rígida por outra de menor impacto se entendesse ser suficiente para a investigação. "Compreendo possível e constitucionalmente adequada a condução coercitiva [...] sempre que for em substituição a uma medida cautelar mais grave", afirmou Fachin, relator da Lava Jato no STF, legitimando as práticas da operação.

Essa posição, contudo, foi vencida. Fachin e Barroso disseram, ao votar, que há um discurso corrente em prol da manutenção de um sistema penal leniente com crimes de colarinho branco, mas que vem disfarçado de preocupação com os direitos dos mais pobres.

Fonte: Folhapress

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